Portugueses e a internet na quarentena – I

Por Inês Narciso, ISCTE-IUL

Portugal não escapa à tendência mundial de crescimento no consumo dos media, sobretudo de carácter informativo e o ranking atual dos sites mais visitados pelos portugueses é tradução viva disso.

O MediaLab Cies_Iscte, no âmbito do projeto de investigação Monitorização de propaganda e desinformação nas redes sociais, analisou as mudanças na tabela dos sites mais visitados pelos portugueses entre 24 de fevereiro e 23 de março de 2020 em Portugal, disponibilizados pela Amazon através da plataforma Alexa.
Os dados ainda não demonstram o verdadeiro impacto das alterações das últimas duas semanas, porque refletem sempre os últimos 30 dias mas já é possível retirar conclusões pertinentes.

O top 9 mantém-se inalterado, com especial destaque para o jornal A Bola. Apesar dos relatados problemas com vendas físicas, os jornais desportivos na sua dimensão online não parecem, até ao momento, prejudicados com a interrupção das competições oficiais, ao contrário de sites com conteúdo desportivo, como o Visão de Mercado ou o Zero Zero, que desceram ou desapareceram da lista. No entanto, esta situação deverá alterar-se à medida que a análise se centrar apenas nas semanas pandemia.

TOP 9 (Fonte: https://www.alexa.com/topsites/countries/PT)

Relativamente aos serviços de streaming, o Twitch TV sobe algumas posições e o Netflix tem uma subida significativa (sobe mais de 5 posições). Algumas plataformas torrent têm também um destaque positivo.

Os sites de venda online não têm até ao momento um comportamento uniforme. O OLX permanece na 11ª posição mas outros sites de vendas como o Ali Express e a Amazon desceram significativamente e o site Ebay deixou até de aparecer no top 50, indicando que as vendas online de produtos não essenciais não estará a aumentar com a pandemia.

TOP 10-20 (Fonte: https://www.alexa.com/topsites/countries/PT)

O mesmo padrão errático surge na banca eletrónica com uma subida da CGD e do Santander, e uma descida do Millennium BCP (os únicos três no top 50).

Os serviços do governo como as Finanças e o portal de acesso geral tiveram todos um decréscimo de algumas posições, à excepção da Segurança Social que teve um aumento.

A Microsoft ganhou vários lugares no ranking, quer com a sua plataforma online, quer com o seu Office, provavelmente resultado do teletrabalho e das aulas à distância.

TOP 21-30 (Fonte: https://www.alexa.com/topsites/countries/PT)

Para aqueles que previam um aumento no consumo de pornografia até ao momento, em Portugal ele não se traduziu nos dados, muito pelo contrário. Vários dos sites do top 10 e 20 nacional de Fevereiro desceram posições e alguns desapareceram até do top 50. Houve no entanto uma entrada nova, de um site para masturbação via webcam onde qualquer utilizador pode ver e publicar conteúdo a troco de dinheiro.

TOP 31-40 (Fonte: https://www.alexa.com/topsites/countries/PT)

De registar ainda os sites da operadora de reservas de hotéis Booking, pelo parar das viagens à escala global e do Instituto Português de Meteorologia, porventura pela permanência em casa da população, que também desapareceram do ranking.

Mas se há um sector vencedor, ele é sem dúvida a comunicação social com pendor informativo, com a RTP, o Público, Notícias ao Minuto, Jornal de Notícias com subidas acima das 10 posições e entradas novas do Correio da Manhã, do Observador e do Expresso.

TOP 41-50 (Fonte: https://www.alexa.com/topsites/countries/PT)

Esta tendência tem-se verificado um pouco por todo o mundo, nomeadamente no Brasil e é traduzida também no crescimento das páginas dos órgãos de comunicação social nas redes sociais, nomeadamente no Facebook. Segundo dados da plataforma Crowdtangle sobre Correio da Manhã, Jornal de Notícias, TVI24, Sic Notícias, Público e Notícias ao Minuto o número de interações com os posts destes meios aumentou exponencialmente desde o dia 10 de Março.

Fonte: Crowdtangle, 2020

No entanto, alguns destacam que esta aparente recuperação dos media não resultará em aumentos de receitas, argumentando que os rendimentos da publicidade diminui apesar de um maior tráfego, devido aos problemas económicos em geral. Outros encaram a ocasião como uma oportunidade, destacam um aumento em geral do número de subscritores e de doações. No fundo, captam a sensação de que as batalhas apenas se podem vencer quando estamos bem informados e que a qualidade da informação, tal como a saúde, não deve ser tomada por garantida.


Nota: Este texto foi elaborado com base nos dados de dia 23 de Março, 10H, disponíveis aqui e comparados com dados de dia 23 de Fevereiro, 10H, disponíveis aqui.

Imagem de destaque: JOSÉ GOULÃO/LUSA